naturalidade
São Paulo
fontes
- Hemeroteca Digital Brasileira da Biblioteca Nacional - memoria.bn.br
- Acervo Digital do Jornal "O Estado de São Paulo" - acervo.estadao.com.br
- Site da Academia Brasileira de Música - www.abmusica.org.br
- Jornal "A Folha de São Paulo" - 08/10/1998 - artigo do jornalista Irineu Franco Perpétuo
- Documentário “Yara Bernette, uma personalidade artística”, documentário independente, produzido por Regina Costa em 1993/1994.
- Enciclopédia Itaú Cultural - Verbete “Yara Bernette”. http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa636791/yara-bernette
Atualizado em 10.11.2018
VERBETE

Yara Bernette

N. 14 de Março de 1920
F. 31 de Março de 2002
Por Marcia Pozzani

Bernette Epstein (Yara Bernette, nome artístico) nasceu em 14 de março de 1920, em Boston (EUA), e veio para o Brasil ainda bebê, aos 6 meses de idade, com seus pais, radicando-se em São Paulo (SP). Aos 6 anos, começou a estudar piano com seu tio, o grande mestre Joseph Kliass (1895-1970), depois de ter contato com o piano já em seus primeiros anos de vida.

Em 1931, houve uma apresentação infantil no Theatro Municipal de São Paulo (TMSP), e Bernette participou, como aluna de Kliass. Em 1934, o Colégio Osvaldo Cruz, onde estudava, fez uma festa de comemoração com a participação de seus alunos, e ela executou peças de Liszt e Glinka-Balakirev, além de integrar, como acompanhadora ao piano, o conjunto orfeônico do ginásio. O evento foi transmitido pela Sociedade Rádio Cosmos. No ano seguinte, 1935, o professor Kliass fez uma audição no Salão Dr. Gomes Cardim, do Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, apresentando seus alunos: Stella Lopes, Isabel Mourão, Ana Stella Schic, Bernette Epstein, Mariazinha Nogueira, Tatiana Mirochnihoff e outras meninas. Bernette executou o Concerto para órgão em dó maior, de Bach-Boskoff, e La vida breve, de De Falla.

Sua estreia profissional aconteceu em 1938, aos 18 anos, no TMSP, como solista do Concerto No. 1 de Chopin, sob regência do jovem maestro Souza Lima, com a orquestra Sinfônica Municipal, sendo muito aplaudida pela plateia, e elogiada pelos críticos de arte. No mesmo ano, fez uma apresentação no Teatro Municipal de Campinas, integrando o Quarteto Teixeira de Carvalho, composto dos seguintes músicos: João Ebner (violino), Antônio Teixeira de Carvalho (viola), Fausto Macuco Borges (violoncelo) e Bernette Epstein (piano). Além de obras de câmara, no programa também constaram peças ao piano solo de Bach, Scarlatti, Liszt e Chopin. Em 1939, Bernette e sua prima, Anna Stella Schic, tocaram na festa de encerramento do período escolar do Instituto Jardim América, como alunas da escola, no Salão do Clube Piratininga.

Em 1940, a Sociedade Filarmônica de São Paulo realizou um concerto no TMSP, apresentando a jovem pianista. No mesmo ano, teve a honra de apresentar em primeira audição no Brasil e na América do Sul, o Concerto No.3 para piano e orquestra de Sergei Rachmaninoff, uma das obras mais importantes do repertório universal, sob regência do maestro Ernest Mehlich. Os críticos ficaram impressionados com sua execução, por sua disciplina de solista, forte personalidade e grandiosa interpretação. Em 1941, apresentou-se novamente no TMSP, em recital interpretando obras de Bach-Busoni, Beethoven, Chopin, Debussy e obras de autores brasileiros, e também no Teatro Municipal do Rio de Janeiro (TMRJ) com obras de Vivaldi, Beethoven, Debussy, Rachmaninoff, Villa-Lobos, Camargo Guarnieri e Chopin. Ainda neste ano, solou os Concerto No.1 de Chopin e o Concerto No.3 de Rachmaninoff, com orquestra sob regência do maestro Souza Lima, e foi convidada por Mario de Andrade para ilustrar a conferência que proferiu na Sociedade de Cultura Artística de São Paulo.

Em 1942, encorajada por Arthur Rubinstein e Claudio Arrau, amigos de seu tio e professor Joseph Kliass, viajou sozinha para os EUA, opondo-se à sua família. Solicitou um empréstimo, e partiu para Nova York. Anos mais tarde, afirmou que, ao longo de sua carreira, nunca teve nenhuma espécie de subsídio do Estado ou qualquer apoio financeiro. Fez todas as negociações para um concerto e realizou sua estreia internacional no Town Hall. Foi unanimemente aclamada como "A nova estrela brasileira de teclado" e se colocou em alta posição no mundo da música de concerto. Nos EUA, decidiu usar o nome Yara Bernette, e assim passou a assinar, a partir de novembro de 1942. Em entrevista, disse que os empresários americanos lhe sugeriram que arranjasse um nome artístico, e Bernette optou por usar Yara, nome que além de bem brasileiro, indígena, sempre achou belo e harmonioso, sendo o nome da principal personagem da ópera "Lo schiavo", de Carlos Gomes. Considerava que o nome Yara lhe dera sorte, agradara e lhe servira de "talismã". Quando criança, aos 12 anos, usou este nome como pseudônimo, para assinar um sambinha, sua composição, chamado "Chegou a tua vez de sofrer", bem ao estilo de Sinhô.

Retornou a São Paulo em novembro do mesmo ano, e deu um concerto no TMSP, tocando obras de Mendelssohn, Mozart, Schumann, Beethoven, Debussy, Szymanowski e Villa-Lobos. Permaneceu no Brasil, dando muitos concertos e recitais, durante a deflagração da Segunda Guerra Mundial. Em 1944, apresentou diversos recitais, e solou o Concerto No.4 de Beethoven, sob regência do maestro Edoardo di Guarnieri. Em 1945, tocou em eventos da Cultura Artística de São Paulo, e no Rio de Janeiro.

Em 1946, retornou aos EUA, e apresentou-se novamente no Town Hall, em Nova York, recebendo do famoso crítico Virgil Thomson, do NY Herald Tribune, as palavras: "Yara Bernette é uma pianista impecável. Possui a mais bela sonoridade ouvida na última temporada”. O NY Times afirmou: "Possui uma técnica que combina clareza, limpeza, firmeza e grande agilidade. Seu sentido de forma e arquitetura musical é admirável, e ela está apta, perfeitamente, a jogar com grandes massas de sonoridade". Irving Kolodin, do NY Sun, qualificou sua execução da Chacone, de Bach-Busoni de definitiva. Permaneceu cinco anos no exterior, realizando cinco extensivas turnês, dando concertos nos EUA, tocando com a Filarmônica de Nova York, e percorrendo por três vezes o Canadá, México, as Ilhas Caraíbas e outros países da América Central e América do Sul. Foi uma das primeiras pianistas a levar a música brasileira à América Central, tocando Villa-Lobos, Mignone, Guarnieri e Fructuoso Vianna, sendo aclamada pela crítica. O pianista mexicano Francisco Bayer, ao ouvi-la em concerto no México, ficou tão impressionado com a jovem pianista por sua técnica e execução, que decidiu ir ao Brasil a fim de se aperfeiçoar com os professores Joseph Kliass e Magda Tagliaferro.

Em 1950, recém-chegada dos EUA, apresentou-se pela Sociedade de Cultura Artística de São Paulo, tocando obras de Bach, Beethoven, Schumann, Debussy e Prokofieff.

Ao longo de sua carreira, tocou numerosos recitais e concertos nas principais cidades brasileiras, participando como solista com as orquestras sinfônicas de São Paulo e do Rio de Janeiro. H. J. Koellreuter escreveu no Diário de São Paulo: “Yara Bernette eletriza a todos com a força persuasiva de sua personalidade, entregando-se integralmente à obra, extraindo de si mesma o máximo. Sem dúvida merece o título de uma das maiores, senão a maior musicista brasileira da atualidade". A artista plástica Tarsila do Amaral, em uma crônica publicada em 1952, disse: "Quem não conhece Yara Bernette? Quem não lhe conhece o dom de empolgar, quando suas mãos maravilhosas percorrem o teclado de um piano".

Em 1951, o renomado artista plástico Flávio de Carvalho retratou-a em trabalho óleo sobre tela, pintura que pertence atualmente ao Museu de Arte Brasileira - Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), em São Paulo.

Em 1952, foi convidada a participar das gravações do filme "Appassionata", de Fernando Barros, dublando as mãos da atriz Tônia Carrero, que interpretou uma consagrada pianista, executando a Sonata Op.57 (Appassionata), de Beethoven. As intepretações que se ouvem ao piano no filme são de Yara Bernette.

Em 1954, tocou dois recitais no Teatro Santa Isabel em Recife (PE), com obras de Scarlatti, Bach-Busoni, Brahms, Schumann E Villa-Lobos. Nesta época, apresentou-se também em Curitiba (PR). Após realizar inúmeros recitais e concertos no Brasil, EUA, Canadá, México, América Central, Ilhas Caraíbas, Venezuela, Colômbia e Argentina, seguiu para o continente europeu.  

Um dos pontos altos de sua carreira foi em 1955, quando apresentou-se na França com a Orquestra de Concertos do Conservatório de Paris, tocando as Bachianas brasileiras No.3 sob a regência do próprio compositor, o maestro Heitor Villa-Lobos. Pode assim conversar com Villa-Lobos, e receber dele orientações sobre como interpretar suas composições. Realizou a seguir um recital na Sala Gaveau, em Paris. Seguiu então para Londres, Zurique, Amsterdã, Viena, Londres e outras importantes cidades europeias. No encerramento da temporada de concertos em Londres, recebeu a medalha comemorativa Arnold Bax Special Memorial Award, por sua interpretação de música do século XX, em especial a música de Villa-Lobos, e ofereceu um concerto aos membros da Sociedade Anglo-Brasileira, em Canning House (Londres), com obras de Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Bach-Busoni e Chopin. Ainda neste ano, solou o Concerto No.4 de Beethoven com a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (RS), sob regência do maestro Pablo Komlós.

Desde tenra idade, dedicou-se ao ensino, aconselhada por Kliass, que considerava de grande importância a atividade pedagógica para o amadurecimento de seus alunos como músicos. Em 1956, criou um curso de música para leigos, direcionado a ouvintes para ampliarem suas possibilidades de compreensão das obras ouvidas. Na década de 1990, retomaria este curso com novo enfoque.

Em 1957, integrou a banca julgadora do concurso "Magda Tagliaferro, promovido pela Rádio MEC, no Rio de Janeiro, ao lado de Antonietta Rudge, Eurico Nogueira França, Ênio de Freitas e Castro e Iris Bianchi. Também realizou dois concertos no TMRJ, executando o Concerto No.3 de Rachmaninoff sob regência do maestro Souza Lima. No final deste ano, empreendeu nova excursão para a Europa, sendo convidada no ano seguinte a ser solista no Festival Brahms, durante a Semana de Grande Gala da Filarmônica de Berlim, sob regência do maestro Karl Böhm. Em seguida, realizou recitais em várias cidades da Argentina, e apresentou-se duas vezes no Teatro Colón, de Buenos Aires, como solista frente à Orquestra Sinfônica Nacional, retornando depois à Europa, onde, somente na Alemanha, realizou 24 concertos e recitais, apresentando-se como solista com orquestra 22 vezes em 29 dias.

Em sua próxima turnê à Europa, foi contratada para tocar no Oriente Médio, e também atuar em concertos com as Sinfônicas da Suécia, Noruega, Finlândia e Dinamarca. Tocou também em Berlim, Frankfurt, Lübeck, Baden-Baden, Stuttgart, Bochum e em outras cidades, além de percorrer a Espanha, Itália, Grécia e Israel, sempre com grande entusiasmo da crítica. Kurt Westphal, um dos maiores críticos alemães, escreveu no Der Kurier: "Existem ainda pianistas excelentes: esta é a convicção daqueles que, durante os últimos anos, têm ouvido em Berlim artistas de diferentes países. Mesmo assim, Yara Bernette assume ainda entre os melhores, um lugar de destaque. A brasileira, que pela primeira vez se apresentou em Berlim, não dispõe apenas de uma técnica perfeita (quem não a tem hoje em dia?). É também uma musicista completa. Nada é artificial, todo o pormenor é sentido e trabalhado em função do conjunto. Sua riqueza em gradação dinâmica não conhece limites”. Suas interpretações de Debussy foram comparadas às de Gieseking.

Em 1959, recebeu prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor solista. E em 1959 e 1960, a série "TV Concerto", em São Paulo, iniciou seus programas apresentando-a, com obras de Brahms, Chopin, Liszt e Ravel.

Em 1960, viajou para Estocolmo (Suécia), para fazer uma nova turnê pela Europa. Lá, executou o Concerto No.1 de Tchaikovsky com a Filarmônica de Estocolmo sob regência de Schmidt-Isserstedt. O concerto foi transmitido pela rádio sueca. Em seguida, foi para a Finlândia, Alemanha, Espanha e Grécia, tocando em cidades como Helsinque, Frankfurt, Baden-Baden, Heidelberg, Duisburgo, Atenas, Darmstadt, Stuttgart, Lübeck, Bochum, Gelsenkirchen e Colônia. Com a Orquestra Sinfônica de Frankfurt, tocou as Bachianas brasileiras No.3 de Villa-Lobos, sob regência de Otto Matzerath.

Em Heidelberg, no Festival Mozart, solou o Concerto No.24 de Mozart com a Orquestra Sinfônica Municipal de Heidelberg, sob regência de Karl Rucht. Em Stuttgart, fez duas apresentações, solando o Concerto No.2 de Brahms sob regência de Ferdinand Leitner, com a sinfônica local. Em Bochum, solou o Concerto No.3 de Rachmaninoff, com a Orquestra Sinfônica Municipal sob regência de Franz-Paul Decker. Em Gelsenkirchen, executou o Concerto No.1 de Tchaikovsky, sob regência de Richard Heime. Novamente aclamada pela crítica, chegou a ser comparada a Wilhelm Backhaus. Pelo êxito obtido na Europa, foi contratada para nova turnê em 1961, para tocar na Suécia, Finlândia, Noruega e Dinamarca.

Em 1960, no Brasil, foi solista do Concerto No.4 de Beethoven sob regência de Franz-Paul Decker, no TMSP, com a Orquestra Sinfônica Municipal, e também tocou com o violinista Nathan Schwartzman e a Orquestra de Câmara de São Paulo. Nesta época, integrou a banca julgadora do 1º Concurso de Piano promovido pela Rádio Eldorado. No final de 1960, seguiu para a Europa, iniciando nova turnê na Alemanha (Hamburgo, Munique, Berlim, Stuttgart), onde executou o Concerto No.3 de Prokofieff. Em 1961, foi para os EUA, retornando em seguida à Europa, a fim de cumprir contratos na Escandinávia, executando o Concerto No.2 de Brahms. Ainda neste ano, apresentou-se no programa TV Concerto, do Canal 5, com obras de Chopin. No ano seguinte, realizou nova excursão à Europa. Foi solista da Filarmônica de Hamburgo sob regência de Hans Schmidt-Isserstedt, e foi convidada a dar mais cinco concertos naquela cidade. Seus concertos foram gravados e transmitidos pela Rádio de Hamburgo, que atingia na época aproximadamente 7 milhões de ouvintes. Ainda em 1962, realizou uma turnê pelo sul do Brasil, e depois representou o Brasil no II Festival Interamericano de Música em Washington, onde apresentou em primeira audição nos EUA as Variações sobre um tema nordestino para piano e orquestra, de Camargo Guarnieri. Também foi convidada a integrar a banca julgadora do prestigiado Concurso internacional de Piano Van Cliburn, nos EUA. Depois integraria também o júri dos concursos internacionais de piano Gina Bachauer em Salt Lake City, e o da Universidade de Maryland, ambos nos EUA. No Brasil, recebeu as condecorações "Imperatriz D. Maria Leopoldina" e "Carlos Gomes". Foi considerada a melhor pianista do ano em 1959, 1961 e 1963, pela Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Foi eleita membro da Academia Brasileira de Música, ocupando a cadeira No.17.

Em 1964, solou o Concerto No.24 de Mozart e o Concerto No.3 de Prokofieff no TMSP, retornando à Europa alguns meses depois, onde passaria a residir. Em 1967, apresentou-se no Teatro Amazonas, em Manaus (AM), inaugurando a série "Dimensões Brasileiras da Música", com obras de Haydn, Beethoven, Guarnieri, Chopin e Schumann. No mesmo ano, tocou em Curitiba no Auditório da Reitoria da Universidade Federal do Paraná um recital com obras de Mozart, Brahms, Chopin, Guarnieri e Schumann.

Em 1968, empreendeu uma turnê pelo oriente, que se iniciou na Grécia, Chipre, Irã, e foi até Índia, Indonésia, Tailândia, Ceilão, Hong-Kong e Singapura.

Em 1969, gravou nos estúdios da Deutsche Grammophon, em Munique, o seu primeiro LP, com a primeira gravação mundial da integral dos Prelúdios Op.23 e Op.32 de Sergei Rachmaninoff, porém apenas 9 dos 10 Prelúdios Op.23 e 11 dos 13 Prelúdios Op.32 foram incluídos no disco (a gravação integral seria lançada apenas em 2017). Esta gravação tornou-se referência internacional, embora não tenha sido lançada no Brasil na época. Ao comentar o disco, David Hamilton, na revista norte-americana High Fidelity, comparou-a a gigantes como Horowitz, Richter e o próprio Rachmaninoff na execução destas peças. Em 1970, realizou um recital para a TV Cultura Canal 2, no Teatro Anchieta, São Paulo, com obras de Haydn, Mendelssohn, Beethoven, Guarnieri, Chopin e Schumann.

Em 1972, a Escola Superior de Música e Artes Dramáticas da Universidade de Hamburgo, contratou-a para suceder o renomado Conrad Hansen, que se aposentava da cátedra de piano, em um concurso do qual participaram mais de 100 candidatos de todo o mundo.

Embora nunca tenha estudado fora do Brasil, seu tio e professor Joseph Kliass recebia em sua casa como hóspedes grandes pianistas internacionais como Arthur Rubinstein, Claudio Arrau, Alexander Borovsky, Rudolf Firkusny, Gyorgy Sandor, e Witold Malcuzynski. E, desde os 7 anos de idade, podia conviver com estes gigantes do piano, tocar para eles, e ouvi-los em reuniões. Quando saiu do Brasil pela primeira vez, aos 20 anos, tinha nestes pianistas além de orientadores, amigos que lhe abriram decisivas oportunidades.

Em 1976, no Festival de Inverno de Campos do Jordão, ministrou o curso "O piano e o solista no repertório sinfônico". No ano seguinte, foi solista do Concerto No.1 de Chopin, sob regência do maestro francês Jean Pierre Jacquillat, com a Sinfônica Municipal de SP. Ainda em 1967, tocou dois recitais no MASP integralmente dedicados a Beethoven, incluindo cinco Sonatas e outras peças, e solou o Concerto No.4 do mesmo compositor no Teatro Cultura Artística, com a Orquestra Sinfônica Estadual sob regência de Volker Wangenheim.

Em 1978, como parte de seu trabalho na Escola Superior de Música de Hamburgo, matinha um curso especial que contava com 18 vagas para alunos, jovens pianistas oriundos de diversos países, alguns dos quais apresentaram-se com sucesso em concursos nacionais e internacionais. Em 1979, no programa Encontros Sinfônicos da TV, Canal 2, é exibido o Concerto No.3 de Rachmaninoff solado por ela, sob regência de Eleazar de Carvalho, gravado no Teatro Cultura Artística.

Em 1981, apresentou-se em São Paulo com integrantes do renomado Quarteto Amadeus, conjunto de câmara inglês. Em 1984, iria apresentar-se no TMSP tocando o Concerto No.1 de Chopin. No entanto, a orquestra do teatro não compareceu, devido a reivindicações por melhores condições de trabalho. Para não desapontar o público, um pouco antes do concerto, Yara convenceu o maestro francês Jean-Bernard Matter a tocar com ela a dois pianos, depois de um breve ensaio, e no final executou outras peças ao piano solo para completar o programa. No mesmo ano, interpretou duas Sonatas de Beethoven e as 4 Baladas de Chopin em um recital no Teatro Cultura Artística, em São Paulo. Em 1987, durante 4 dias, deu aulas públicas no MASP, voltadas para a obra de Chopin e de Rachmaninoff. Em 1988, comemorou seus 50 anos de carreira artística (jubileu de ouro), realizando uma excursão por várias cidades brasileiras, como Ribeirão Preto, Porto Alegre, Curitiba, Rio de Janeiro, Campinas, Belo Horizonte e Brasília.

Em um concerto realizado no Festival Inverno de Campos do Jordão em 1988, encontrou-se com o violinista Ayrton Pinto e o violoncelista Antônio Del Claro, músicos de carreira internacional, e, juntos, decidem criar o um conjunto camerístico, ao qual Yara deu o nome de Artistrio. O trio recém-formado apresentou-se neste ano no Teatro Maksoud Plaza, em São Paulo, com obras de Brahms e Mendelssohn. Pouco depois, tocaram obras de Bach no TMSP. O trio recebeu o prêmio de melhor conjunto de câmara de 1988 pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Nesta época, fizeram uma turnê pela Europa, que incluiu um concerto no Klavier-Festival Ruhr, na Alemanha, com obras de Brahms e Dvorák. Também se apresentaram no TMSP com trios de Beethoven, Brahms e Mendelssohn. Após este recital, Yara foi homenageada com uma placa com o seu nome no Salão dos Arcos do TMSP.

A partir de 1988, voltou a residir no Brasil depois de se aposentar, tendo permanecido por 16 anos radicada na Alemanha.

Em 1989, no Festival de Inverno de Campos do Jordão, o Artistrio apresentou-se tocando obras de Haydn, Brahms e Dvorák. Ainda neste ano, na série especial Ciclo Beethoven, no Maksoud Plaza, Yara executou quatro Sonatas de Beethoven, e, em outro recital, apresentou-se com o Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo o Quinteto de Schumann.

Em 1990, completou 70 anos de idade e anunciou sua intenção de dar cursos livres de piano no Brasil. Nesta época, o Artistrio gravou um CD com os Trios No.1 e No.3, de Villa-Lobos, e solou o Concerto Tríplice de Beethoven com a Orquestra Sinfônica do Paraná sob regência de Osvaldo Colarusso, no Teatro Guaíra, em homenagem aos 220 anos do nascimento do compositor. Em 1992, o trio apresentou-se no Centro Cultural Banco do Brasil.

Entre 1993 e 1994, foi filmado o documentário independente “Yara Bernette, uma personalidade artística”, de 15min 30s de duração, produzido por Regina Costa, com diversos depoimentos da pianista, fotos e trechos de vídeos.

Em 1995, Yara foi homenageada pela Escola Superior de Música de Hamburgo, na Alemanha, e ganhou um especial dedicado a ela veiculado pela NDR, rede de TV alemã. Neste ano, aos 75 anos, voltou a gravar ao piano solo, no Teatro Cultura Artística, em São Paulo, um disco intitulado "Encores", álbum independente, com direção artística de Denis Wagner Molitsas e Evandro Pardini. O CD foi constituído de 19 peças de curta duração dos compositores Scarlatti, Paradies, Mendelssohn, Schumann, Brahms, Chopin, Debussy, Rachmaninoff e Villa-Lobos. Em 2000, na série Grandes Pianistas Brasileiros, o selo Master Class recuperou duas gravações inéditas da pianista feitas três décadas antes para rádios alemãs: o Concerto No.2 de Medtner com a Filarmônica de Munique, regida por Rudolf Kempe, e o Concerto No.2 de Helm com a Sinfônica de Bamberg, e regência de Ferdinand Leitner. Também em 1995, foi lançado o CD “Piano brasileiro”, pela Funarte, contendo gravações raras de diversos pianistas brasileiros, que incluiu a Dança brasileira de Camargo Guarnieri interpretada por Yara Bernette em 1974.

Em 1998, comemorou 60 anos de carreira, e foi homenageada pelo Memorial da América Latina, onde interpretou o Concerto No.1 para piano e orquestra de J. S. Bach com a Orquestra de Câmara da UNESP sob regência de Ayrton Pinto. Neste ano, promoveu uma série de saraus destinados à audição de música erudita, em sua residência, no bairro Brooklin, em São Paulo. Ela os denominou "Encontros musicais com Yara Bernette", e informou: “não se trata de um curso, e o único pré-requisito é gostar de música", com uma linguagem que atendesse tanto ao público leigo, como a especialistas, utilizando vídeos e CDs. Foram abordados os grandes pianistas do século XX, como Rubinstein, Arrau, Horowitz, Michelangeli, Gould e Cortot. Colaboraram o engenheiro Sami Douek (fabricante de caixas acústicas) e o colecionador Denis Molitsas (fornecendo gravações raras). Yara tinha intenção em realizar um novo ciclo de encontros dedicado a pianistas brasileiros, mas isto provavelmente não se concretizou. Em 1999, interpretou obras Mozart, Beethoven e Chopin, em um recital no Teatro Maksoud Plaza.

Faleceu em 31 de março de 2002, aos 82 anos. Ao todo deu cerca de 4.000 recitais e concertos ao longo de sua carreira, que abrangeu praticamente 7 décadas.

O acervo de Yara Bernette foi doado ao colecionador e produtor Denis Molitsas, contendo críticas, correspondências, mais de 60 gravações em fitas-rolo, além de cerca de 20 horas de entrevistas gravadas em áudio. Molitsas declarou que posteriormente este acervo será doado ao Instituto de Estudos Brasileiros da USP.

 

Repertório geral de obras para piano solo e música de câmara da pianista:

Antonio Vivaldi - Concerto para órgão em ré menor;

Bach-Boskoff - Concerto para órgão em dó maior;

Bach-Busoni – Chacona;

Beethoven - Sonatas No.8, No.17, No.18, No.21, No.23, No.26, No.31, Trio No.4 Op. 11, 7 Bagatelas Op. 33;

Brahms - Capricho Op.116 No.3, Fantasias Op.116, Intermezzo Op.117 No.2, Trio No.3, Sonata No.3;

Camargo Guarnieri - Ponteios No.22, No.24, No.30 e No.45), Dança brasileira, Dança negra, Valsa No.7;

Chopin - Andante spianato e Grande polonaise brillante Op.22; Valsa Op.64 No.1; Sonata No.3; Estudo Op.25 No.12 e pelo menos outros dois Estudos; Mazurca Op.7 No.3; Noturno Op.48 No.1; as 4 Baladas;

De Falla - La vida breve;

Debussy - Reflets dans l'eau, La terrasse des audiences du clair de lune (Prelúdio No.7 do Livro II), Feux d'artifice (Prelúdio No.12 do Livro II), e mais pelo menos 2 outros Prelúdios, Suite pour le piano;

Glinka-Balakirev - l’Alouette;

Granados - La maja y el ruiseñor;

Haydn - Andante com variações em fá menor;

J. S. Bach - Fantasia cromática e Fuga, Partita No.2, Suíte inglesa No.3;

Liszt - Sonetto del Petrarca Op.104, Mephisto valse;

Mendelssohn - Trio Op.49 em ré menor, Scherzo;

Mozart - Fantasia em dó menor, Quarteto para piano em sol menor K.478;

Mussorgsky - Quadros de uma exposição;

Paganini-Liszt - Estudo No.5 “La chasse” (A caça);

Paradies - 2 sonatas;

Prokofieff  - Sonata No.3, 6 Visões fugitivas;

Rachmaninoff - Prelúdios Op.23 (ciclo completo), Prelúdios Op.32 (ciclo completo);

Ranzato - Serenata galante (para violino e piano);

Ravel - Toccata;

Scarlatti-Tausig - Pastorale e Capriccio;

Schumann - Sonata No.2, Quinteto Op. 44, Carnaval Op.9, Estudos sinfônicos;

Villa-Lobos - Impressões seresteiras, Choros No.5 “Alma brasileira”, Dança do índio branco, Festa no sertão, A prole do bebê No.1 (talvez completa).

 

Repertório de concertos para piano e orquestra da pianista:

Beethoven - Concerto No.4, Concerto tríplice para piano, violino e violoncelo;

Brahms - Concerto No.2;

Camargo Guarnieri - Variações sobre um tema nordestino;

Chopin - Concerto No.1;

Helm - Concerto No.2;

J. S. Bach - Concerto No.1

Medtner - Concerto No.2;

Mozart - Concerto No.24;

Prokofieff - Concerto No.3;

Rachmaninoff  - Rapsódia sobre um tema de Paganini, Concerto No.3;

Tchaikovsky - Concerto No.1, Concerto No.2;

Villa-Lobos - Bachianas brasileiras No.3;

 

Músicas dedicadas à pianista:

Almeida Prado - Prelúdio No.7;

Camargo Guarnieri - Valsa No.7, Ponteio No.45, (o Concerto No.3 para piano e orquestra foi originalmente dedicado a Yara Bernette, porém depois foi dedicado a Jaime Ingram);

Luis Ellmerich - Prelúdio III