naturalidade
Rio de Janeiro
fontes
KATER, Carlos. Eunice Katunda, Musicista Brasileira. São Paulo: Annablume, 2001a.
KATER, Carlos. Música Viva e H.J.Koellreutter Movimentos em Direção à Modernidade. São Paulo: Musa, 2001b.
HOLANDA, Joana Cunha de. Eunice Katunda (1915-1990) e Esther Scliar (1926-1978): Trajetórias Individuais e Análise de “Sonata de Louvação” (1960) e Sonata para Piano (1961). Porto Alegre: UFRGS, 2006. Dissertação (Doutorado em Música), Departamento de Música, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Atualizado em 14.09.2017
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Eunice Katunda

N. 14 de Março de 1915
F. 3 de Agosto de 1990
Por Joana Cunha de Holanda

Eunice Katunda (cujo sobrenome também era grafado como “Catunda") foi uma das musicistas mais atuantes no cenário musical brasileiro de meados do século XX. Sua identidade como musicista engloba as de pianista, compositora, regente, arranjadora e produtora de programas de rádio.

Eunice do Monte Lima iniciou sua formação musical aos 5 anos de idade, com Mima Oswald. Entre os seus professores de piano estão: Mima Oswald, Branca Bilhar, Oscar Guanabarino, Marieta Lion e Camargo Guarnieri. Salientamos a presença de compositores (Bilhar, Guarnieri) na instrução de Katunda ao piano e o provável impacto desse treinamento em sua formação. A figura de uma mulher compositora esteve também presente desde o início de sua trajetória - Katunda tocou a obra Bailado Indígena, de Branca Bilhar, em seu primeiro recital piano solo, em 22 de outubro de 1927, no Instituto Nacional de Música do Rio de Janeiro.

Casou-se com o matemático Omar Catunda em 1934, aos 18 anos, e se mudou pouco depois para São Paulo. Em 1941, no Teatro Municipal de São Paulo, foi a solista do Concerto nº 4 de Beethoven, com regência de Camargo Guarnieri, e, no ano seguinte, iniciou seus estudos com o compositor. Em 1943, escreveu sua primeira obra para piano: Variações Sobre um Tema Popular.

Com a identidade de concertista estabelecida, tocou uma série de concertos na Argentina em 1944, para os quais recebeu carta de recomendação de Heitor Villa Lobos (1887-1959). Já no programa destes concertos, observa-se o compromisso da musicista com a divulgação da música brasileira contemporânea, tendo interpretado obras de Villa-Lobos, Oscar Lorenzo Fernândez (1897-1948), Camargo Guarnieri e dela própria.

A interpretação de obras de compositores brasileiros intensificou-se no período sucessivo. Em 1946, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro e, a partir de 1947, passou a participar intensamente das atividades do Grupo Música Viva, liderado por Hans-Joachim Koellreutter (1915-2005). Katunda tocava praticamente todas as semanas na PRA-2, Rádio Ministério da Educação, no programa intitulado `Música Viva´, dirigido por Koellreutter, e se tornou nesse período a pianista oficial do grupo.

Esta importante iniciativa do grupo Música Viva com seu programa na rádio serviu como estímulo e como veículo de divulgação do trabalho de jovens compositores, entre eles da própria Katunda. Com o foco voltado para a música contemporânea, vários programas foram dedicados ao repertório de vanguarda à época, um repertório abrangente e com maioria de composições inéditas no Brasil.

Em 31/7/1948, viajou à Europa, junto com colegas e com o mestre Koellreutter, para fazer um Curso Internacional de Regência na Bienal de Veneza, onde permaneceu por nove meses e teve contato com músicos como Hermann Scherchen (1891-1966), Bruno Maderna (1920-1973) e Luigi Nono (1924-1990).  Ainda em 1948, fez a primeira audição italiana de Ludus Tonalis, de Paul Hindemith (1895-1963), e recital dedicado à música brasileira promovido pelo Il Diapason, ambos no Teatro Piccolo de Milão. Em dezembro do mesmo ano, teve sua obra Cantos à Morte (1946) regida por Scherchen, e veiculada em programa da Rádio de Difusão Suíça.

Após sua volta ao Brasil, em abril de 1949, atuou predominantemente em São Paulo. Entre suas atividades destacam-se: ministrar cursos de iniciação musical no Museu de Arte Moderna de São Paulo (1951-52) em iniciativa pioneira; criação e direção de um programa semanal na Rádio Nacional de São Paulo intitulado Musical Lloyd (1955-56); atuação como pianista da rádio Gazeta (1957-58), além de atuar como compositora e arranjadora durante todo este período. Em 1958, recebeu, pelo trabalho junto à Rádio Gazeta, o prêmio Radiolândia de melhor pianista atuante em emissoras brasileiras.

A década de 1960 foi marcada por uma intensa atividade como instrumentista e por mudanças na vida pessoal. Neste período realizou duas turnês aos Estados Unidos, apresentando-se no Carnegie Recital Hall. Em 1964, separou-se de Omar Catunda. Em função disso, trocou o “C” de Catunda por “K” para dissociar seu sobrenome do ex-marido.

Nas décadas seguintes Katunda continuou a atuar como professora, compositora e pianista, tendo ministrado cursos na Universidade de Brasília (DF) e nos cursos de Música Contemporânea de São João Del Rei (MG).

O pesquisador Carlos Kater organizou o catálogo de suas composições com diversas peças para piano solo e outras formações em Eunice Katunda: musicista brasileira, editora Annablume (2001). Sua produção compreende um período de quarenta anos, entre 1943 e 1983, e inclui obras tonais, modais, atonais livres e dodecafônicas.

No conjunto da obra de Katunda para piano, várias composições apresentam referências explícitas ou implícitas a material folclórico, indicativas da sua proximidade com pressupostos da escola nacionalista em períodos distintos de sua trajetória. Entre elas Variações sobre um Tema Popular (1943), Estudos Folclóricos (1952), Trovador Obstinado (1958), Sonata de Louvação (1960) e Seresta Piracicaba (1956). Outras de suas obras para piano solo são a Sonatina (1946), Quatro epígrafes (1948), Momento de Lorca (1957), Quatro momentos de Lorca (1958), Seresta em lá (1967), Cinco serestas (ca. 1967), Três momentos em Nova York (1969), Trenodia al poeta morto (1972), Poemas para Carla (1977), Expressão anímica (1979), em Cantos de Macunaíma (ca. 1983). A pianista argentina Beatriz Balzi (1936-2001) gravou seus 2 Estudos Folclóricos (1952) na série de CDS Compositores Latino-Americanos, volume 1. O pesquisador Carlos Kater elaborou o catálogo completo das obras de Katunda em 2001.

 Eunice Katunda faleceu em 3 de agosto de 1990 na casa de seu filho Igor Catunda, em São José dos Campos (SP).